Aquele em que Ted volta no tempo.

Não que Regulus andasse por aí dando em cima de muitas meninas – Por Salazar, Sirius era o suficiente para envergonhar o nome da família naquele sentido -, mas ele definitivamente não estava acostumado a ser rejeitado.

E por uma nascida trouxa, acima de tudo.

Regulus permaneceu sentado, observando Mary se afastar. Pela primeira vez a menina não parecia assustada na presença dele... Definitivamente, não. O modo como ela se afastou rapidamente, e a expressão fechada em seu rosto denotavam algo mais próximo do asco que do susto.

E aquilo deu um nó no estômago dele.

Levantando-se lentamente, ele limpou as próprias vestes, e a fitou mais uma vez. Ela estava emburrada, e segurava o esfregão com tanta força que os nós de seus dedos já estavam brancos.

- McDonald – a voz falha não era o que Reg pretendia, e ele pigarreou antes de continuar – McDonald, eu...

A vontade de Regulus era pedir desculpas, mas as palavras simplesmente não se formavam em sua boca. Muito provavelmente Regulus jamais pedira desculpas antes.

- Eu acredito que você já fez o suficiente por hoje – ele pigarreou mais uma vez – Pode... pode ir embora.

Um suspiro aliviado escapou dos lábios de Imogen quando ela se viu dependendo novamente dos próprios pés, apenas.

- Nunca mais faça isso – ela ameaçou, o dedo em riste e a expressão séria.

Retomando parte da pose altiva de sempre, ela começou a bater as costas das vestes, onde sabia que a grama deveria ter grudado. Não podia ser vista imunda daquele jeito.

- Você sabe muito bem que meu nome é “Imogen”, e não “Imogene”, Theodore. Além disso, eu não vou andar por aí te chamando por um apelido. Não é como se fôssemos íntimos.

- Tem certeza? – a voz de Mary era incerta - Eu nem terminei de limpar o chão... – o olhar que Regulus lhe lançou foi o suficiente para ela entender o recado: era melhor ela ir embora antes que ele mudasse de ideia.


A bruxa juntou os utensílios de limpeza em um canto e lançando mais uma olhada ao rapaz, se ponderou se devia agradecê-lo.

- Bem...obrigada - ela se pegou dizendo. Merlin! Por que tinha que ser tão boazinha? - Eu vou nessa. - ela apontou para a porta e se afastou a passos largos dali. Ainda dava tempo de ir para Hogsmeade!

______

Mary deixou a Dedosdemel, um sorriso de satisfação em seus lábios. O dia estava maravilhoso - ela conseguira se safar de uma detenção torturante; encontrara seus chocolates favoritos na loja e agora caminhava até a Casa dos Gritos para fotografá-la.

Ela amava fotografias - e sempre enviava as fotos que se moviam para casa.

Depois de tirar as fotos, a garota sentou-se em um banco e, sem saber porque, pensou em Black e no modo como ele parecia se divertir com o jeito atrapalhado dela.

E se ele resolvesse se vingar dela de verdade?

Oh não, ela precisava ficar mais alerta...

- Mas o meu nome não é Theodore, Imogene. – ele esticou o braço para tirar um pedaço de grama que grudara nos volumosos cabelos dela. – É apenas Ted.

A mão dele escorregou automaticamente pela mecha de cabelo dela.

- E mesmo que fosse um apelido, acho que já somos íntimos o suficiente pra você me chamar de Ted, Im.

Ele sorriu, tentando soar inocente:


- Afinal, sou praticamente o fiel dos seus maiores segredos.

Regulus parou um menininho da vila, sem idade suficiente para frequentar Hogwarts, e lhe ofereceu duas barras de chocolate para que levasse uma caixa de bombons até uma certa ruiva que estaria fotografando a casa dos gritos.

Por Salazar, o olhar ferido de McDonald ainda lhe atormentava, e ele precisava parar de se sentir mal com aquilo. Talvez os bombons funcionassem, ele torcia.

“Considere sua dívida paga. R.A.B.”, dizia o bilhete.

Era o melhor que ele podia fazer pela grifinória.


***

Foi na segunda-feira. Regulus tinha notado que durante a manhã inteira cochichos eram ouvidos por onde ele passava, mas imaginou que fosse apenas mais alguma coisa que o imbecil do irmão tivesse aprontado.

Foi Imogen quem esclareceu a situação. Enquanto Reg caminhava para a aula daquela tarde, a amiga se aproximou e passou o braço pelo do amigo.

- Já ouviu a nova fofoca sobre a gente?

Como de costume, ele apenas levantou uma sobrancelha e a encarou.

- Fofoca?

- Adam dizendo por aí que viram você me beijando – ela riu – se eles soubessem....

(Regulus e ela tentaram se beijar uma vez, no quarto ano, quando ambos eram curiosos e inexperientes demais. Obviamente, as gargalhadas nunca permitiram que eles chegassem até o fim. Era literalmente como tentar beijar um irmão: uma péssima ideia)

- Te beijando? – uma ruga apareceu na testa do rapaz.
- Bem, a fofoca original é de que viram você beijando uma ruiva. Como eu sou a única ruiva na sua vida...

A expressão de Regulus tornou-se imediatamente mais dura, o que não passou despercebido por Imogen.

- ... A menos que eu não seja? – o tom de voz dela foi muito mais baixo, e Regulus a encarou pelo canto de olho.

- Se alguém perguntar, foi você – desvencilhando-se da amiga, ele girou nos próprios calcanhares – Eu tenho uma coisa para fazer. Te vejo na aula.


Precisava mandar uma coruja para McDonald. Dessa vez ela realmente o pagava!

Mary pegou a caixa de bombons (caros, ela logo notou ao ver a marca) que o garotinho lhe entregou e encarou a guloseima com desconfiança – e se Regulus tivesse os envenenado?

Agradecendo ao garotinho, ela guardou a caixa no bolso e só depois do jantar é que arriscou comer um – e para sua total felicidade, o chocolate derreteu em sua boca sem lhe causar mal algum. Regulus Black tinha bom gosto.

(mas ele bem que podia ter se desculpado ao vivo)

**

Na segunda, Mary enrolou umas torradas num guardanapo e se preparou para correr para a aula de Herbologia – aquele dia os sextanistas teriam aula na Estufa III, a mais distante do castelo e como ela tinha acordado atrasada, não tinha tempo para se sentar e tomar o café com calma. Sua única opção era comer no caminho.

Antes que ela pusesse os pés na escadaria que levava para os jardins, sentiu alguém puxar sua mochila e não precisou nem olhar para saber quem era.

Regulus Black a encarava e parecia bravo.

- Ahn...algum problema? - ela perguntou depois de mastigar a torrada. Estava confusa. Eles dois não interagiam desde a detenção e ela não devia mais nada a ele - ou pelo menos era o que achava.

Os lábios de Imogen se abriram em perplexidade. Não tinha percebido que acabara de entregar sua vida nas mãos do lufano esquisitinho.

- Você não pode falar disso pra ninguém! – ela suplicou.

Por instinto, ela agarrou o braço dele – como se aquele gesto fosse o suficiente para recuperar o segredo.

- Ninguém mesmo. Nem vivo, nem morto! - ela mordeu o lábio inferior, e sentia que a alegria de antes tinha sido completamente substituída pelo medo – Se meus pais souberem disso, eu...

A voz falhou e ela precisou engolir em seco antes de continuar.

- Se meus pais souberem disso e eu tiver sorte, serei transferida pra Beauxbatons na mesma hora. Por favor.

Imogen tinha pais amorosos se comparados com os demais sonserinos – perto de Orion e Walburga, por exemplo, eles eram os melhores pais do mundo -, mas eram também extremamente preconceituosos e rígidos na educação da filha. A menina já tinha ido longe demais em suas teimosias sobre quadribol – ela já perdera a conta de quantos castigos e ameaças receber, mas, depois de passar parte do verão trancafiada no sótão, ela estava certa de que os pais não hesitariam de mandá-la para outra escola (ou, pior ainda, privá-la de se graduar).

Regulus revirou os olhos e, sem falar nada, cravou a mão em um dos braços de McDonald, arrastando-a para a sala de aula vazia mais próxima.

- Qual é o seu problema, McDonald? – ele a largou assim que fechou a porta atrás de si - O que você ganha espalhando esses boatos por aí?

A expressão abobalhada de McDonald só o deixava mais irritado, e, por Salazar, Regulus já estava no nível explodir-coisas-de-tão-irritado.

- Eu não sei como as coisas funcionam no seu mundinho trouxa, McDonald, mas esse boato maldito pode me custar muito caro!

A energia acumulada dentro dele já era tamanha que ele começara a andar de um lado para o outro.

- Mas que merda!!

Naquele ponto, Regulus a segurou pelos ombros, olhando diretamente nas íris esverdeadas.

- O que você ganhou espalhando por aí que me beijou?

- Hey, calma - Ted se desvencilhou do aperto dela e a segurou pelos ombros - Eu só tava brincando.

Pelo modo como os olhos dela tinham se arregalado, ela estava falando sério. E Ted, agora, podia entender porque ela tinha que se esgueirar até o campo de Quadribol para voar com a vassoura furtada do melhor amigo: porque era algo proibido para a garota.

- Não vou contar pra ninguém, prometo. - ele a assegurou e depois que ela estava mais calma, os dois voltaram para o castelo. 

***

Na segunda, Ted estava tomando seu café quando parou para prestar atenção na conversa das duas quartanistas sentadas ao lado dele:

- Você ficou sabendo? Regulus Black está saindo com a Imogen Greengrass. - uma delas cochichou (ou melhor, tentou).

- Sério?

- Alguém viu os dois aos beijos nos jardins!

Ted franziu a testa enquanto tentava não escutar mais a conversa daquelas duas. Imogen tinha um namorado, então...?

Seus olhos castanhos pousaram na figura solitária da Sonserina e ele suspirou.

Bom, não era de se admirar...

(por que ele estava tão incomodado com aquela informação era um mistério para ele)

Mary tentou manter a calma, mas era impossível não ficar nervosa com o modo como Regulus andava pra lá e pra cá pela sala de aula vazia. E de que boato ele estava falando afinal?!

Ela ficou tão assustada quando o rapaz se aproximou dela e a segurou pelos ombros que quase não escutou a pergunta dele.

-  Espalhar? Beijo? – ela perguntou, bobamente, e de repente todo aquele confronto fez sentido. Ele achava que a culpa era dela! – Eu não fiz isso! Eu não contei pra ninguém...

Ela se desvencilhou do aperto dele.

- Por mim aquele incidente...aquilo...nunca aconteceu! - ela ajeitou a alça da mochila e andou na direção da porta. Não era culpa dela, então ela não devia explicação alguma a ele. E não iria perder uma aula importante de Herbologia por causa dele.

- Por que alguém batiza o filho só de “Ted”? – Imogen perguntou no meio da aula de astronomia, enquanto Ted observava a vigésima lua de saturno (ou algo assim) pelo telescópio – Não é como se fosse um nome de verdade...

Sem que pudesse se conter, Imogen repassara na mente a manhã ao lado de Ted algumas vezes, sempre com um sorriso no rosto. Aquela felicidade toda ela atribuía à aventura e ao fato de ter voado e nem passava por sua mente que o motivo talvez fosse a companhia, mas aquela conversa sobre o nome dele, interrompida pela ameaça – sem graça – de espalhar os segredos dela ficou presa em sua mente, chegando a um ponto tal em que ela só esquecera daquilo brevemente, enquanto tentava descobrir quem era a ruiva misteriosa que o melhor amigo beijara nos jardins.

- Quero dizer, “Ted” normalmente é apelido para Theodore, Edward, ou, sei lá, Edmund. Mas não é um nome...

O garoto a encarava meio perplexo, e ela apenas deu de ombros, o semblante completamente inocente no rosto.

- É verdade...

O cenho de Regulus estava franzido e ele tentava pensar rapidamente. Se McDonald não havia dito nada...

Regulus apressou o passo e se pôs entre a grifinória e a porta.

- Se você não falou nada, isso significa que alguém viu. – Ele encarou os olhos verdes através das grossas lentes dos óculos mais uma vez – E a julgar pela sua mais recente declaração de afeto, você está tão feliz com isso quanto eu.

Desviando os olhos para um ponto qualquer no chão, ele voltou a falar, a voz bem menos agressiva do que antes.

- O que seus amiguinhos da grifinória fariam se descobrissem que você me beijou, McDonald?

Ted queria rir com a explicação de Imogen (quando e porque ela havia pensado em tudo aquilo?) – mas se segurou ao máximo para não fazê-lo. Não queria chamar a atenção do professor.

Ele se inclinou para a frente, fingindo mexer no telescópio e murmurou:

- E o que você diz de Imogene? – ele continuava a pronunciar o nome dela errado.

Ele fez um sinal para ela se aproximar do telescópio e enquanto a ruiva se concentrava para ver a lua de saturno, ele decidiu perguntar algo que vinha incomodando ele desde o café da manhã:

- É verdade que você namora o Black?

Ted queria rir com a explicação de Imogen (quando e porque ela havia pensado em tudo aquilo?) – mas se segurou ao máximo para não fazê-lo. Não queria chamar a atenção do professor.

Ele se inclinou para a frente, fingindo mexer no telescópio e murmurou:

- E o que você diz de Imogene? – ele continuava a pronunciar o nome dela errado.

Ele fez um sinal para ela se aproximar do telescópio e enquanto a ruiva se concentrava para ver a lua de saturno, ele decidiu perguntar algo que vinha incomodando ele desde o café da manhã:

- É verdade que você namora o Black?

- Eles não vão descobrir porque eu não vou contar, Black – ela ajeitou os óculos que haviam escorregado para a ponta de seu nariz e o encarou. Estava mais calma agora.

A única certeza que ela tinha é que quem quer que tivesse espalhado aquela fofoca não tinha reparado na identidade dela – o que significava que ela estava a salvo. Ufa.


- E mesmo que eu contasse ninguém faria nada. A não ser que eu dissesse que você me forçou... – e aqui ela sentiu o rosto corar e se odiou por isso. Balançando a cabeça, ela ergueu o pescoço para encará-lo novamente – Olha, Black, esquece isso. Já já vão inventar uma nova fofoca e nem vão lembrar que você andou trocando saliva com alguém por aí.

Ela fez uma careta ao dizer aquilo e fez menção de empurrá-lo para passar pela porta.

Os olhos cinzentos de Regulus se arregalaram com a ameaça da garota – desde quando McDonald tinha tanta atitude? – mas, enquanto ele involuntariamente ignorava o restante da fala dela, a ideia de que a grifinória realmente sentia que tinha sido obrigada àquele beijo se tornou algo muito palpável para ele.

Regulus tinha muitos defeitos, mas definitivamente não era do feitio dele forçar carícias com garota alguma.

Antes que ela pudesse empurrá-lo, ele a segurou pelos ombros, da forma mais delicada que pode, e procurou o olhar da menina.

- Nunca quis te forçar a nada.

Travando uma batalha interna, ele conseguiu se forçar a dizer as palavras seguintes:

- Me desculpe, McDonald.

Soltando os ombros da menina, ele deu um passo para o lado, deixando de obstruir a passagem.

- É Imogen, “Ted”. – Im fez questão de frisar as aspas com os dedos, enquanto se inclinava para olhar pelo telescópio – É um nome real, ok? Pelo menos meus pais não inventaram nada...

A menina estava distraída com os astros quando a pergunta dele chegou ao seu ouvido, e se assustou. Em uma rara demonstração de falta de habilidade, em vez de se afastar do telescópio, ela se aproximou, enfiando o olho com tudo no visor.

- OUCH! – Imogen se afastou, levando a mão ao ponto em que batera, enquanto alguns colegas mais próximos riam da cena.

- Greengrass! – Ralhou o professor – Posso saber o motivo de tanto escândalo?

- Eu bati meu olho... – o tom dengoso da menina foi tão acidental quanto o machucado, mas pareceu convencer o professor.

- Vá para a enfermaria. Smith, acompanhe-a, sim?

--

A enfermaria estava lotada. Aparentemente, alguma coisa no jantar não estava tão boa assim, e uma dúzia de alunos passou mal. Madame Pomfrey corria de um lado a outro para dar conta de todos os pacientes, de modo que, quando Imogen chegou, o melhor que a enfermeira pôde fazê-la foi sentá-la em uma maca, e oferecer uma poção cicatrizante e algodões para Ted.

- Cuide dela, sim, querido? Eu preciso... Ora, senhor Potter, mantenha-se em sua maca... – ralhando com os demais, ela se afastou, deixando os dois sozinhos.

- É melhor fazer isso direito – Imogen afastou a mão que cobria o olho, e nem percebeu que fazia um biquinho.

Ted encarou Imogen, achando graça na manha dela:

- Bom, dizem que o pessoal da lufa-lufa tem a mão boa para cuidar dos outros... - ele embebeu o algodão de poção cicatrizante e se aproximou da garota. Antes mesmo que encostasse nela, Imogen fez uma careta - Ora, não seja uma bebezona. - ele disse, girando os olhos.

Ela abriu a boca para protestar e Ted aproveitou aquele momento de distração para encostar o algodão nela. A poção teve efeito em instantes e só para diminuir o desconforto causado pelo líquido, ele começou a assoprar o local (bom, era o que a avó dele costumava fazer e dava certo...)

Quando Ted deu por si estava com o corpo praticamente colado ao de Imogen e se a iluminação fosse melhor ele até poderia contar as sardas espelhadas pela bochecha dela. Estava tão focado nela que os gritos de dor dos outros pacientes ficaram em segundo plano. 

- 'Cê...tá melhor...?   - ele gaguejou e, sem perceber, mudou a cor de seus cabelos para um tom vermelho berrante (seus poderes sempre fugiam de seu controle quando ele se sentia nervoso e Merlin, ele estava nervoso...)

Imogen levantou as pálpebras aos poucos, o rosto ainda enrugado em uma careta pelo desconforto causado pela poção cicatrizante – precisava mesmo arder tanto?  Pelo menos a tática de Ted de assoprar o lugar deu uma aliviada...

O que Imogen não esperava era que o garoto estivesse tão perto – o cheirinho de sabonete que ela sentia devia tê-lo denunciando, mas ela nem pensou naquilo. Antes que ela pudesse responder, os fios vermelhos chamaram sua atenção. Arregalando os olhos, ela sussurrou para ele:

- Seu cabelo ficou vermelho de novo!

(Se Ted realmente queria guardar segredo sobre ser um metamorfomago, ele definitivamente precisava fazer um trabalho melhor.)

Foi preciso um pouco de esforço para segurar o riso com a reação meio exagerada dele, mas Im não podia perder a chance de provocá-lo.

- Você devia experimentar um chapéu... Tenho certeza de que tenho um bem cafona no fundo do meu malão. Posso te emprestar, se você quiser.

Apoiando os braços ao lado do corpo, ela se inclinou para a frente e o provocou, quase sussurrando.

- Aposto que vai combinar com o seu cabelo!

Antes que ela pudesse se entregar ao riso, uma sombra atrás de Ted entrou em seu campo de visão, e instintivamente a menina mudou seu semblante para o tom altivo de sempre.

- Fazendo amizade com os meros mortais, Greengrass? – Sirius Black, o irmão traidor do próprio sangue de Regulus, se aproximou, o tom jocoso de sempre impregnando suas palavras e os braços cruzados contra o peito.

Imogen revirou os olhos, impaciente.

- Ainda não é dessa vez que você está certo, Sirius– com movimentos delicados e quase imperceptíveis, a menina tirou a varinha do bolso – Mas, agora que você não é mais um Black,  talvez a gente deva testar a teoria da sua mortalidade... Que tal se começar arrancando a sua cabeça? – erguendo a ponta da varinha até o pescoço, ela fez um movimento de um lado ao outro, em uma clara imitação de uma degolação. O sorriso no seu rosto, entretanto, era tão inocente quanto o de uma criança.

Sirius riu sob a respiração, e, desfazendo a cruzada de braços, cutucou Ted nas costelas.

- Melhor tomar cuidado com essa aí, novato. Aparentemente, ela ladra e morde! – Pela primeira vez desde que chegara, Sirius deu uma boa olhada no rosto de Ted, e as sobrancelhas negras logo se uniram em um esforço para pensar – Você me lembra alguém...

Mary ficou sem reação por alguns segundos com o pedido (totalmente inesperado) de desculpas de Black, mas não demorou muito para se recompor. Pousou os olhos verdes no rosto dele, analisando-o e percebeu que ele parecia um pouco arrependido do que tinha feito.

Aquilo era o suficiente para ela.

Encarou o garoto e, segurando a alça da mochila com mais força, reuniu um pouco de coragem:

- Tudo bem Black, já passou - ela encolheu os ombros - Não sei porque você tá pensando tanto nesse assunto.

E sem esperar resposta, ela deixou a sala.

Quem sabe agora que as coisas estavam em pratos limpos ele ia deixá-la em paz?

Olhando o relógio de pulso ela notou que estava atrasada e soltou um palavrão antes de sair correndo em direção às estufas e enquanto corria ela conseguia avistar mais uma detenção para sua lista.

(e pela segunda vez seria culpa de Black)

Quando recebeu uma coruja do Prof. Slughorn avisando que deveria tomar conta de uma detenção naquela noite, Regulus xingou baixinho. Uma coisa era perder tempo com o propósito de castigar McDonald, outra, completamente diferente, era virar bedel em tempo integral. Não era para isso que o aborto do Filch servia, no fim das contas?

- Recado da ruiva misteriosa? - Imogen sussurrou, tentando ver o que estava escrito no pergaminho, e Regulus revirou os olhos.

Pelo menos aquela noite de trabalho serviria para ele evitar as perguntas constantes da amiga – Por Salazar, ela não parecia disposta a deixar aquele assunto morrer, e sob a maldição Imperius ele pretendia contar que beijara uma nascida trouxa. Nem em mil anos que Imogen o perdoaria.

Enfiando o livro de poções embaixo do braço – agora que tinha que fazer os próprios deveres, era melhor se manter em dias com a matéria – ele marchou até o quinto andar, onde, segundo as instruções de Slughorn, a aluna deveria polir as armaduras do corredor leste.

Regulus terminava de subir os últimos degraus quando a visão de McDonald, sentada em um canto no chão, chamou sua atenção. Os cabelos ruivos quase escondiam o rosto da menina, enquanto ela olhava para o que parecia ser um álbum de fotografias, apoiado em seu colo.

Por Salazar, ele achou que já tivesse se livrado da garota.

- McDonald – ele pigarreou, enquanto se aproximava – é você quem vai cumprir detenção hoje?

O coração de Ted deu um solavanco.
 
Primeiro porque ele estava na presença de Sirius Black - Sirius, de quem ele tinha ouvido o padrinho contar inúmeras histórias sobre. Sirius, que pelo que a avó Meda contara, crescera num ambiente infeliz e passara a vida adulta preso em Azkaban por um crime que não cometera. 
 
Aos 17 anos, Black tinha um ar de rebeldia e riso ao seu redor que lhe caíam como uma luva. E pelo brilho no olhar dele, o rapaz era deveras astuto (Ted teve que desviar o olhar dele)
 
Segundo motivo para ele ficar tão nervoso: ali estava o melhor amigo de seu pai. Reparando nele.
 
Pigarreando, o jovem metamorfomago tentou pensar numa desculpa (ele era péssimo trabalhando sobre pressão):
 
- É que eu tenho um rosto muito comum. - ele soltou uma risada sem graça e estendeu a mão para Sirius - Sou Ted T...Smith.
 
Sirius achou graça no gaguejar dele e riu, mas apertou sua mão calorosamente:
 
- Sirius Black.  – Sirius virou-se para Imogen – Você está namorando meu irmão então, cunhada?
 
Ted olhou para Imogen – a expressão dela de puro desdém (Merlin, como uma pessoa podia mudar a expressão em segundos daquela maneira sem ser metamorfomaga?) e torceu para que ela apenas ignorasse Sirius (mas pelo tom de voz dela ao se dirigir ao Grifinório mais cedo, ignorá-lo era a última coisa que ela iria fazer).

Mary olhava para as fotos com carinho – ao longo de seus 5 anos ali tinha reunido aquela pequena coleção de fotografias das mais diversas coisas (dos amigos, da Lula Gigante nadando preguiçosamente no lago, o castelo no Natal...). Fotografar era o hobby favorito dela e ela adorava capturar e colecionar pequenos momentos (que acabavam significando MUITO no final). Estava dando risada de uma foto dela e das amigas no lago quando uma voz – já conhecida – a sobressaltou.

Droga. Quando ele ia parar de cruzar o caminho dela?


- Sim, sou eu. – ela estava contando que Remus Lupin a vigiaria (o rapaz com certeza a ajudaria –sem querer- a limpar todas aquelas armaduras com magia e os dois ficariam jogando conversa fora até o final da detenção. Esse era o plano dela. Mas pra variar Black arruinara tudo). Ela fechou o álbum com um suspiro resignado.  Black nunca a deixaria se safar daquela detenção ilesa.

Caminhou até o pano e a poção de polir aço e se preparou para sua tortura, os ombros arqueados em sinal de derrota.

Imogen se sentiu subitamente nervosa com a pergunta – assim como na aula de astronomia – mas, dessa vez, tudo o que ela fez foi estreitar os olhos para Black. Apesar de ser uma ótima mentirosa, ela não queria mentir, por algum motivo que ela desconhecia (afinal de contas, não tivera problema nenhum em confirmar a história para as dez pessoas que a pararam naquela tarde).

- Nós tivemos que esperar você ser deserdado para assumir – ela falou rapidamente, pulando da maca e caminhando até a frente de Sirius – Meus pais jamais aceitariam que eu entrasse para uma família que tem você como primogênito.

Apesar da diferença de altura, o jeito empinado da menina possibilitava que eles se encarassem como iguais. Franzindo o nariz e dando de ombros ela continuou:

- Sabe como é, né? – erguendo uma das mãos, ela acariciou o ombro do rapaz como quem dá condolências a alguém – Pode deixar que eu mando suas felicitações ao Reg. Agora, se você nos dá licença, temos uma aula para assistir.

Sem importar se o seu salto fazia barulho contra o chão de pedra, Imogen caminhou alguns passos em direção à saída, até perceber que Ted continuava parado no mesmo lugar.

- Smith? – ela chamou, olhando por cima do ombro – Os mapas astrais não vão se fazer sozinhos, sabia?


***

Enquanto caminhavam pelos corredores escuros do castelo, Imogen sentia um peso inexplicável sobre os ombros, e uma certa vergonha que a impedia de encara Ted mesmo à pouca luz.

Talvez porque o garoto tinha se mostrado tão bom em guardar segredos – ele basicamente já tinha o suficiente para transformá-la em uma pária -, ou talvez apenas porque estivesse cansada de mentir o dia inteiro, mas a língua da garota parecia coçar contra o céu da boca, a vontade de falar a verdade a consumindo.

Mas ela não podia. Diferente de pedir ajuda a um lufano ou de voar clandestinamente, aquele segredo era de Regulus, e não seu. E sua lealdade estava com ele, acima de tudo.
- Foi só um beijo – ela falou, por fim, as palavras escapando de sua boca antes que pudesse controlá-las – Regulus e eu não somos namorados, o que as pessoas viram foi só um beijo.

Ainda era uma mentira, mas parecia acalmar parcialmente a inquietação dentro dela.

- Mas eu nunca liguei para as fofocas sobre mim, de qualquer jeito...

Ao contrário da sala de troféus, não havia nenhum lugar confortável no corredor em que Regulus pudesse se sentar. Assim que a menina se levantou, ele deu de ombros e se sentou ao lado da bolsa dela, já que aquele era um lugar tão bom quanto qualquer outro.

Ele precisava admitir que ficara surpreso com a presença da menina – tinha imaginado que tomaria conta de algum moleque remelento que bradasse por aí ser o sucessor dos marotos – mas, ainda assim, não tinha a intenção de interagir com ela. McDonald havia deixado muito claro o que pensava dele, e ele sabia o que pensava dela, então não valia nem um pouco a pena se desgastar com aquilo.

Mary McDonald era uma piada velha.

Enquanto a menina polia as armaduras – ele podia ouvi-la resmungar aqui e ali – os olhos dele vagaram de uma descrição maçante dos efeitos da Amortentia (a poção da próxima aula) até o álbum de fotografias que ela largara sobre a bolsa.

O que será que havia de tão interessante na vida de uma grifinória?

Mais uma vez, a curiosidade falou mais alto e, ladinamente, Regulus enfiou o grosso álbum no bolso expandido de suas vestes. Olharia as fotografias com calma depois.

Uma olhada rápida para McDonald despertou a lembrança do beijo nos jardins, e Regulus se remexeu, desconfortável.

Ele também não sabia por que pensava tanto naquele acidente.


***

McDonald não era uma má fotógrafa. Havia uma coisa aqui ou ali um pouco mais artística que Regulus não entendia muito bem, mas, de uma forma geral, aquele álbum era um diário visual da estadia da menina na escola. Foi com um pouco de inveja que ele observou os momentos felizes da menina (e, por vezes, do próprio irmão). À exceção da melhor amiga e do quadribol, os anos de Hogwarts haviam sido um inferno para ele. Era preciso sempre pisar em ovos, em uma briga de egos constante com os colegas.

E ali estava McDonald, alguém que sequer deveria frequentar aquela escola, sequer deveria ter o dom da magia... Tendo uma experiência muito melhor que a dele.

***

Regulus tinha um plano: achar um momento de distração da Mary e devolver o álbum para a mochila da menina, intacto.

Mas não foi isso o que aconteceu.

Enquanto ele cozinhava a sua Amortentia – Merlin, ele deveria se apaixonar por um elfo doméstico, pelo cheiro forte de produto de limpeza que sentia – a ideia de se divertir um pouco mais com McDonald foi tomando força.

- Até que a Evans imprime bem em fotografias, para uma trouxa – ele falou, sem levantar os olhos do seu caldeirão, e reprimindo o sorrisinho que se formava em seu rosto – mas às vezes é difícil distingui-la da Lula Gigante...